Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (18 de Junho de 2015)

Hoje cruzei-me quatro vezes com um homem que parecia a morte. Por baixo dos seus olhos negros, as profundas covas escavadas, como um abismo que ataca o tempo, assustariam qualquer pessoa. Não era um homem feio, mas tinha a morte estampada no rosto, viva nas rugas irregulares e inesperadas, num corpo tão jovem. Ele fez-me lembrar todas as pessoas próximas de mim que faleceram, que partiram, deixando-me mais sozinho nesta corrida da vida. As imagens dos meus amigos mortos desfilaram pela minha imaginação numa fracção de segundo e eu não pude abrandar nem evitar o seu ritmo enlouquecedor, como se aquele homem tivesse implantado à minha volta um intenso gerador de lunacia. Quando acabei de me lembrar de todos os meus conhecidos falecidos (e recordei pessoas que julgava nunca mais poder recordar, que já estavam tão esquecidas que não faziam mais parte dos meus pensamentos), comecei a pensar nas pessoas famosas recentemente mortas e não pode deixar de odiar um pouco aquele homem, que me parecia ser o responsável por todas essas mortes, por todos esses tristes fins debaixo do céu.
Tive que passar quatro vezes por ele, para não passar um número que pudesse suscitar-me superstições. Dá azar passar por um homem que parece a morte uma vez, duas vezes, três vezes. Quatro em princípio já não. Em princípio.

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