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A mostrar mensagens de 2016

Não Gosto (55) P

Tenho um horror profundo a ter tecido colado a uma ferida. Há alguns anos, numa disputa de bola durante uma futebolada num relvado sintético com os meus amigos, fiz uma grande ferida na perna, que ia quase do joelho ao pé e, mais tarde, enquanto dormia, ela colou-se aos lençóis da minha cama. Fiquei agoniado quando reparei que além da ferida me estar a doer terrivelmente, arrastava com ela o lençol da cama. Arrancá-lo da minha perna causou-me tanta dor, que o meu estômago ainda se contrai sempre que recordo esse gesto. A princípio estava a fazê-lo lentamente, com uma expressão de puro sofrimento no meu rosto, olhos faiscantes com inevitáveis lágrimas e dentes cerrados, mas a certa altura decidi literalmente arrancar o mal pela raiz e fiz um desesperado gesto rápido que foi acompanhado de um urro descomunal que saiu das profundezas das minhas goelas, subiu ao último andar do prédio em que dormia e desceu até às catacumbas do Diabo juntando-se ao horrível coro infernal, o choro sádico d

Não Gosto (54) P

Não gosto de símbolos indicadores de género para as casas de banho de restaurantes e bares demasiado abstractos. Muitas vezes acontece-me ficar a olhar algum tempo para aquelas formas super estilizadas e sem um significado claro, sem que conseguisse descortinar o seu significado, hesitando entre entrar numa ou noutra porta. Quando me dirijo a uma casa de banho não estou à espera de ter de resolver um enigma complexo antes de poder fazer o que lá fui fazer. Demasiado envergonhado para perguntar, costumo arriscar entrar numa. Tenho cinquenta por cento de hipóteses de acertar. Claro que se vivêssemos numa sociedade aberta e avançada não seriam necessárias casas de banho para homens e para mulheres, usaríamos todos a mesma e ninguém se queixaria, antes pelo contrário, mas já que nos querem em casas de banho distintas, ao menos ponham uns símbolos claros. Num filme de Herzog, ele mostra imagens estilizadas de homens e mulheres até bastante comuns e supostamente fáceis de interpret

Comiseração (61) (P)

Nadir Veld Oh não, o tempo está a tentar matar-me outra vez e mandou em seu nome um rádio portátil com relógio digital cujos minutos vão avançando silenciosamente na noite descontrolada. As horas passam e o desejado sono nunca chega. Entro na cama, saio da cama, pego num livro, absorvo-me no livro e o sono não chega. Procuro outro método de induzir o sono no meu cérebro, mas ele está altamente activo e não se coíbe de me lembrar dos meus mais aterradores medos sempre que pode. A noite tornou-se numa bela manhã enquanto perseguia o sono e, apesar de eu me ter mantido alerta todas as horas de escuridão, sinto muito mais que fui vencido pela noite do que a venci a ela. Perdi-me em sonhos nas suas trevas românticas. Agradam-me as ruas nocturnas porque o imprevisível está mais presente nelas e isso faz com que eu me deixe levar por fantasias e acabe os meus dias a projectar quimeras e a desenvolver longas conversas imaginárias com pessoas da minha vida. Na noite em que os reuni a

Comiseração (60) (P)

Oh não, estas pessoas estão a tentar matar-me puxando temas de conversa para os quais devia estar preparado, mas, de facto, não estou, ou, pelo menos, não estou absolutamente seguro de todas as respostas e eu temo muito dizer a coisa errada, a coisa ao lado. Nunca aconteceu, mas é-me absolutamente insuportável alguém vir ter comigo e dizer “epá, aquilo que tu disseste ontem sobre aquele artigo que estava a bom preço em x lugar, vi-o a metade do preço ontem em y lugar!”. Ser-me-ia insuportável ouvir essas palavras de depreciação. Sentiria o nojo que as pessoas sentem por mim a lamber-me os braços e sujando-me com o seu muco contagioso. Sentir-me-ia tão envergonhado que teria de escavar ali mesmo um grande buraco para me enfiar em lágrimas. Por isso estas pessoas que vêm ter comigo com perguntas complexas deixam-me sempre deprimido e nervoso. Só tenho vontade de me ir embora de onde estou e ir estudar os livros todos, todas as hiperligações, estudar todo o problema para depois falar

Poema de Oscar Wilde com referência a D.Sebastião

36. The Grave of Keats  RID of the world’s injustice, and his pain,     He rests at last beneath God’s veil of blue:     Taken from life when life and love were new   The youngest of the martyrs here is lain,   Fair as Sebastian, and as early slain.     No cypress shades his grave, no funeral yew,     But gentle violets weeping with the dew   Weave on his bones an ever-blossoming chain.   O proudest heart that broke for misery!     O sweetest lips since those of Mitylene!   O poet-painter of our English Land!   Thy name was writ in water——it shall stand:     And tears like mine will keep thy memory green,     As Isabella did her Basil-tree.  ROME. Poema em que Oscar Wilde refere D. Sebastião, belo e morto jovem como convém às grandes lendas.

Cães Asseados, Cães Javardos, Cães Danados (Zenit Saphyr, 2016)

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https://www.youtube.com/watch?v=ARi7VGsjyUg&feature=youtu.be O meu filme sobre cães sujos a falarem uns sobre os outros.

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (6 de Novembro de 2016)

Enquanto regressava a casa depois de ter ido ver o jogo do Benfica contra o Porto em casa de uns amigos meus aqui em Cracóvia, pensava no quão cínico era o futebol e quão pouco concebível era a alegria que eu não conseguia esconder. Caminhava numa zona suburbana desta cidade polaca e nem o ar pouco amistoso com que as pessoas me encaravam naquele lugar em que não costumam aparecer estrangeiros fazia com que eu perdesse o sorriso que tinha na cara e com que brindava quem quer que comigo se cruzasse. O Carlos e o Tiago ficaram duas raivas e ideias fixas antagónicas. Eu não tomei posição nenhuma, só estava feliz por o Benfica ter "ganho". O Carlos defendia a tese de que o Benfica não tinha jogado nada e que eles mereciam perder "que era para aprenderem". Não tinham feito nada o jogo todo, não tinham tido atitude, não tinham jogado à Benfica. O Tiago dizia que isso não interessava, que jogar bem não era tudo, às vezes as equipas têm de ser manhosas para emaranhar o adve

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (12 de Junho de 2016) Passado

Hoje acordei em Szeged no sul da Hungria, depois de ter chegado ontem por volta das 23 horas. Ainda saí para a louca noite húngara e não me arrependi porque vi coisas incríveis como danças sem fim na lama, saias subidas para cima para que se vissem as cuecas, um pénis erecto e uma rapariga de volta dele, um ouriço cacheiro iluminado pela luz branca de um telemóvel e duas mulheres a dirigirem-se a mim em húngaro com vozes que pareciam sedutoras. Deitei-me muito tarde, por volta das 4 da manhã, mas hoje consegui acordar às 8 para conhecer a cidade antes de apanhar o autocarro para Subotica, na Sérvia, onde combinei estar hoje à tarde com uma amiga minha. Enquanto explorava as cercanias da linda Igreja de Szeged em busca de bons ângulos para a contemplar, encontrei o Panteão da Universidade, onde estão dezenas de estátuas de antigos alunos ilustres. Foi com um misto de espanto e nojo que caminhei pela galeria entre as estátuas de físicos, escritores, biólogos e bioquímicos, entre estudi

Não Gosto (53) P

Não gosto de pessoas que arranham o fundo do prato com a serrilha da faca enquanto cortam a sua comida. O som produzido com este arranhar é extremamente irritante e parece entranhar-se pela minha pele através da parte de trás do pescoço e desce através da espinha dorsal provocando arrepios em todo o meu corpo. É um som agudo absolutamente horrível e difícil de suportar. Sempre que o meu amigo Carlos me convidava para um almoço ou um jantar eu inventava uma desculpa para não ir porque já sabia que ele ia arranhar o prato com a faca de forma descuidada, quando o seu bife há muito estava cortado. Ele até é uma pessoa agradável com que eu gosto de estar e falar, mas nunca às horas das refeições! Eu acho que ele tem um problema qualquer de audição que o impede de ouvir as altas frequências, por isso não repara quando está a serrar o prato com a serrilha. Eu não lhe digo nada por uma questão de delicadeza, porque somos amigos e porque já o avisei uma vez. Ele pediu desculpa, mas continuou a

Amores que odeiam (P)

Ao passarem por mim as mulheres ajeitam os óculos com dedo do meio Só porque tive a distinta lata de medir o tamanho do seu apetitoso seio E lançam-me cruéis esgares e decerto também olhares de ódio cheio A mais nobre e educada donzela cospe no chão à minha passagem Se me cruzo com elas à beira rio elas queriam estar na outra margem Se vêem numa rua deserta voltam atrás após apocalíptica travagem Deixando claro que o seu amor é uma miragem Quando lhes pergunto as horas Insultam-me sem demoras Ao passarem por mim sussurram maldições entre dentes Sei que só a minha morte as deixará contentes Que posso fazer para ser igual às outras gentes? Nadir Veld

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (6 de Setembro de 2016) (P)

Mais um ano passou e com este já lá vão cinquenta e sete voltas ao sol. Cinquenta e sete voltas ao astro e ainda há tantas coisas que tenho de fazer debaixo dele! Quando um dia acaba sinto sempre que o perdi irremediavelmente, que o desperdicei, que gastei mais uma vez o meu tempo a fazer e a pensar em coisas menores, a degradar a minha filosofia de vida e a minha forma de ver o mundo a trabalhar para que terceiros lucrem com o meu esforço, a cansar-me para que outros tirem benefícios disso, a suar e a sangrar para que Dinossáurios de Biblioteca bebam deleitados as excreções do meu empenho, a ver as minhas oportunidades de liberdade passarem a correr nas ruas movimentadas enquanto fumo infindáveis cigarros à janela do meu prédio, a pensar mais no que devia fazer do que a fazer realmente o que devo fazer, a planear uma viagem nunca concretizada a África, a ler notícias que nada interessam e a perder o meu tempo pensando nelas, a ler livros e a estudar filosofias gastas, a ver filmes sem

Gosto (66) P

Gosto de espevitar temores adormecidos nos meus amigos, de os assustar e de lhes provocar um medo que, não raras vezes, toma proporções sobrenaturais. Lembrei-me de escrever sobre isto quando lia 'A Ponte no Rio Drina', mais especificamente a parte em que Ivo Andrić narra a forma como os meninos da cidade de Višegrado lidam com a lenda do Mouro Negro, que estará aprisionado numa das bases da ponte cuja história é contada no livro. Nessa base há um buraco por onde se pode espreitar para o interior e quem vislumbrar o Mouro morre instantaneamente. Uma ou outra criança mais brincalhona e pouco dada a superstições, finge ter visto o homem e começa a gritar 'o Mouro, o Mouro!' e larga a correr pela margem fora, assustando os outros e "assim estraga o jogo e provoca desilusão e indignação àqueles que gostam de jogos de fantasias, odeiam a ironia e acreditam que, ao olharem intensamente, podem realmente ver e viver alguma coisa", como escreve o autor no seu excelente

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (30 de Agosto de 2016) (P)

À atenção dos meus amigos: nunca abram uma lata de cerveja acabada de cair ao chão, nem mesmo que se tenha furado e esteja a aspergir espuma ameaçadoramente. Hoje, quando ia a subir uma rua de Belgrado com o meu amigo Robert, segurando numa mão uma garrafa de cerveja que estava a beber e usando a outra para segurar duas outras cervejas que ele tinha ido comprar e os calções que me caíam por não ter cinto. Na minha última viagem emagreci muito devido a longos períodos sem comer e ainda não tive dinheiro para comprar um cinto. Segurar as duas latas de meio litro e os calções era um difícil equilibrismo, mas não quis dar parte fraca pedindo ao Robert que me levasse as latas de cerveja que me tinha acabado de oferecer, por isso continuei a andar e a beber da minha, que estava bem fresca e me sabia maravilhosamente na tarde quente, porém, a certa altura, possivelmente devido a um passo descuidado, as calças caíram-me quase até aos joelhos. Motivado pelo facto de estar sem roupa interior, fi

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (25 de Junho de 2016)

Estava em Košice na Eslováquia, a ver o jogo do europeu de futebol que opunha Portugal à Croácia, na esplanada de um café na zona central da segunda cidade eslovaca, sentado à mesa com um homem que não conhecia, mas tinha-me sentado ali por não haver mais mesas vazias e aquela ter boas vistas para o televisor. Já no prolongamento, depois de ter bebido três ou quatro cervejas, chamei a empregada para pedir mais uma. 'Jedno pivo' disse-lhe, num eslovaco perfeito e levantei o dedo indicador para simbolizar o um com a mão. Quando ela voltou trazia consigo duas cervejas. Ainda pensei que a segunda cerveja fosse para uma outra pessoa presente na esplanada, mas ela trouxe ambas para mim. Em inglês, porque o meu eslovaco não chega para explicações nem reclamações, disse-lhe que era apenas uma cerveja e fiz novamente o símbolo que eu há muito achava universal para o número um, um indicador esticado em nenhuma direcção particular, simplesmente indicando uma quantidade, uma unidade. A emp

Gosto (65) P

Gosto das raparigas que andam de Vespa na grande cidade de Roma com os seus cabelos ao vento debaixo do capacete negro, com óculos de sol, que lhes dão um ar misterioso, quase imperscrutável, escondendo os seus olhos brilhantes, cheios de vida e com as suas lindas pernas bronzeadas surgindo de brancas saias provocadoras com rendilhados que deixam entrever alguma deliciosa pele. Gostava que, um dia, uma delas parasse e me desse uma boleia rumo à felicidade desejada, seria a concretização de um grande sonho. Pode dizer-se que tenho uma pancada por estas jovens desconhecidas e posso facilmente passar um dia a olhar para a estrada e a vê-las passar, com um sorriso pervertido na cara expressando toda a depravação de um louco solitário. Gosto também do facto de os italianos se deslocarem tanto de mota, a sua forte presença nos filmes não é um estereótipo exagerado, pois acaba por ser o modo mais inteligente de se deslocarem por aquelas típicas ruas estreitas em que dificilmente um carro pass

Gosto (64) (P)

Gosto de palavras com muitas consoantes seguidas, principalmente palavras eslavas. A minha estadia no leste permitiu-me adquirir a capacidade de pronunciar palavras lunáticas como šmrt (a minha favorita em termos de significado), štvrtok (a minha favorita em termos de sonoridade), vlk, krv, srdc, msze, crvki (que se prenuncia tsrvki, pois na maior parte das línguas eslavas o 'c' lê-se 'ts' - o nome do realizador Emir, nascido na Bósnia, em Sarajevo, não se pronuncia 'Kusturika', como a maior parte das pessoas diz em Portugal e noutros países, mas sim 'Kusturitssa') entre outras, que significam, respectivamente, morte, quinta-feira, lobo, sangue, coração, massas e igreja. Todas elas são em eslovaco, pelo menos, pois podem ser comuns a várias línguas eslavas, excepto a penúltima que é em polaco e a última que é em sérvio. Até aprendi a cantar e a inserir algumas destas palavras de difícil pronuncia nas minhas cantorias. Para mim é muito desafiante e enriqu

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (24 de Agosto de 2016)

Em Bolonha, com um grupo de raparigas e também alguns rapazes extremamente imaginativos, apreciava as suas capacidades criativas enquanto faziam jogos colectivos que os divertiam nas quentes noites de verão. Elas tinham um papel com uma lista de desafios rabiscados que iam concluído ao longo das horas. Abordaram-me porque tinham escrito na folha que deviam encontrar um bolonhês casado que tivesse aliança e que andasse na rua às três da manhã. Eu disse-lhes que estavam com azar, que eu nem sequer era bolonhês, tinha nascido no Brasil. Elas acharam isso bastante exótico e convidaram-me a juntar-me ao seu grupo. Sentei-me na sua roda. O próximo desafio era cantar músicas que previamente ouviam, usando apenas sinónimos da letra original, sem que com isso desvirtuassem o verdadeiro sentido do poema. Foi muito divertido ver o esforço que faziam para encontrar palavras adequadas. A forma hesitante com que iam progredindo e avançando, revirando os olhos para procurar na sua memória mostrava qu

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (26 de Agosto de 2016)

Voltei hoje à cidade em que estou a viver actualmente, Novi Sad, depois de mais uma viagem pelos balcãs, em que passei pela bósnia e herzegovina, a macedónia, o kosovo e pela albânia, onde estive mais tempo. Neste lindo país conheci pessoalmente aquele que considero um dos melhores e mais apaixonados cantores da actualidade, o enorme Ilir Shaqiri. A ele e à sua abençoada voz, que não precisamos de entender para que nos hipnotize, mando um sincero abraço. De durres, cidade costeira albanesa, ainda fui para a Itália de barco, estive em Ancona, em Roma e em Bolonha, mas tive de voltar para os balcãs porque esta zona apela mais ao meu coração...não gostei lá muito de itália, tem lindas casas e edifícios, mas eu não viajo para ver monumentos, isso posso ver em fotografias. Viajo para sentir o amor das pessoas e um olhar apaixonado e cheio de vida de um albanês vale mais que todos os altares della patria. Em Itália, senti-me também ligado ao terramoto que destruiu Amatrice, por ter pensado

Gosto (63)

Gosto daquilo a que chamo 'um céu de incêndio'. Claro que não gosto de saber que, algures nas redondezas, há uma linda floresta com maravilhosas árvores a morrerem cruelmente, queimadas, consumidas por um fogo intempestivo, mas o fumo que sobe aos céus no momento da incineração das pobres árvores forma uma espécie de cortina à frente do sol que funciona como os filtros que se colocam à frente dos projectores que iluminam as filmagens para dar à cena um aspecto mais adequado com o que se está a passar naquele momento do filme e com o que o realizador quer transmitir ao espectador. Esse fumo transforma a luz do sol e converte-a numa luz ainda mais quente, alaranjada em vez do tom amarelo habitual e eu adoro essa cor, essa luz, por isso, contemplar paisagens com essa iluminação, dá-me um enorme prazer e posso ficar horas a ver essas cores caírem nas casas e nos caminhos. Quando o fumo é muito escuro dá à atmosfera um tom sombrio que também aprecio sobremaneira. Até nem desgosto do

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (18 de Fevereiro de 2012)

Enquanto acompanhava um jogo de futebol num café apareceu uma senhora com todo o aspecto de ser uma dessas pregadoras ambulantes que impingem ideias religiosas aos transeuntes que se cruzam com elas, espalhando principalmente o “testemunho de Jeová” e o evangelismo. Era uma mulher com cerca de 60 anos de cabelo branco e com óculos, com uma jovialidade irritante e com uma resma de revistas que pousou numa das mesas enquanto cumprimentava o senhor do bar e fazia observações pseudo-graciosas sobre o jogo e algumas coisas no café. A princípio ignorei-a e não descolei os meus olhos do jogo, porque estas pessoas normalmente causam-me uma grande repulsa, por isso evito ser abordado por elas, porém, a certa altura olhei para as revistas que ela tinha posto nas mesas porque a palavra escrita interessa-me sempre, ainda que a mensagem verse sobre coisas que não me interessam. Para meu grande espanto, entre as revistas estava aquilo que me pareceu ser um livro “normal”, um romance, mais particula

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (14 de Julho de 2016)

Hoje estava a cruzar a cidade de Subotica em direcção à estação de camionetas, para me ir embora desta cidade no norte da Sérvia e, por alguma razão, comecei a trautear a canção 'Foi na Cruz' de Nick Cave and the Bad Seeds'. Não encontro nenhuma explicação plausível para a estar a cantar naquela altura, mesmo depois de muito ter reflectido sobre isso. Vi uns rapazes húngaros a jogarem ténis na rua, mas isso não me fez pensar em religião nem em desolação, apenas no Novak Djokovic. Quando cheguei à estação liguei ao meu amigo Ricardo para lhe dizer a que horas chegava a Novi Sad e ele fez-me saber que Hector Babenco tinha morrido. Eu e ele partilhamos um grande amor pelo filme 'Pixote' realizado por Babenco. Foi um grande choque porque eu vinha a cantar a canção "foi na cruz, foi na cruz, que os meus pecados castigaram seu jesus" e essa música aparece no filme do qual Nick Cave é um grande fã, por isso compôs uma música em que até canta em português em homen

Comiseração (58) (P)

Enquanto viajava de pé num autocarro para o centro de Bratislava o meu olhar focou-se numa jovem extremamente bela que estava sentada pouco à minha frente. Descrevê-la é uma tarefa difícil e irrelevante. Tratava-se de uma rapariga com todas as formas que encantam os homens e eu percebia que não era o único hipnotizado pela sua beleza quase inigualável. Como ímanes, as cabeças dos homens giravam para aquele polo de atracção e os seus olhos faiscavam de forma animal. Tenho a certeza que muitos deles esqueceram a estação em que deviam sair tão mesmerizados estavam pela sua majestosidade. O seu cabelo loiro caía em deleitosos fios sobre os seus seios protuberantes e nos seus olhos brilhava a vida na sua forma mais pura. Ainda que eu tenha ficado extremamente excitado e, naturalmente, erecto, o sentimento mais forte que ela exerceu sobre mim foi de intensa tristeza e desespero, porque se me afigurava como algo de inalcançável. No meu íntimo eu sei que jamais terei coragem de falar com uma m

Poema em eslovaco

Moj krv je červené Ale moj srdc je čierna Aj zabit' jelen Jeho krv je pivo O meu sangue é vermelho Mas o meu coração é negro Eu mato um veado E o seu sangue é cerveja My blood is red But my heart is black I kill a deer And its blood is beer

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (25 de Julho de 2016) (Passado)

Passeava na praça Blaha Luzja em Budapeste às duas da manhã quando um senhor com uma cara única me chamou a atenção. Tinha cerca de 60 anos e uma expressão dura difícil de qualificar. Parecia que todas as coisas terríveis já se haviam passado na sua vida. Tentei adivinhar a sua história: os seus avós haviam sido massacrados na Segunda Guerra Mundial, dois queimados e os outros lançados ao Danúbio; os seus pais haviam sido presos e torturados pelos nazis, mas conseguiram escapar para depois desaparecerem levados pelo carro negro dos comunistas, nunca mais apareceram; a sua mulher havia morrido a dar à luz o seu segundo filho; a sua filha morrera atropelada nos anos 90 ou desaparecera, raptada pelos alcoviteiros de produções pornográficas. Não sei, não faço ideia, posso apenas deduzir. A única coisa que posso dizer é que ele tinha um inolvidável rosto de sofrimento, uns olhos tristes focados no vazio, revoltados com a vida e uma dor imensa na alma, que contribuía para acentuar a monument

Não Gosto (52) (PP)

Não gosto nada das traduções que Jorge de Sena fez das obras de Ernest Hemingway . Só li dois livros de Hemingway traduzidos por ele, O Velho e o Mar e Fiesta (The Sun Also Rises) . O Velho e o Mar já li há algum tempo, não me recordo ao certo das passagens que mais me revoltaram e desiludiram, mas agora ando a ler Fiesta, que encontrei e roubei de um Hostel de Budapeste, que, para minha grande surpresa tinha um livro em português. Há muitas passagens que me deixaram imensamente estupefacto, vou dar apenas alguns exemplos: “Durante certo tempo a paisagem era bastante a mesma”, “Cohn ia ver se arranjava a fazer a barba”, “Em poucos momentos a choca o foi buscar, amansou-o e fez dele parte da manada”. Recordo que isto são só exemplos. O livro está recheado de frases que não fazem qualquer tipo de sentido, parecendo ter sido escritas por crianças. Para além desses erros há uma frase em que o “há” é trocado por “à”, uma nota de rodapé em que Jorge de Sena se refere aos “peles-vermelhas”,

Não Gosto (51) (PPP)

Detesto aquelas homens que se sentam ao pé de mim nas camionetas de longa distância quando há mais bancos livres e odeio particularmente este gordo que está sentado ao pé de mim enquanto escrevo. Possivelmente fazem-no para cumprir o número do lugar no seu bilhete, mas é inacreditável que continuem lá sentados quando há mais lugares livres. Mas...o que há de errado com estas pessoas? Não querem ir à janela? Preferem estar apertadas num banco durante duas horas em vez de estarem à larga em dois bancos...? E eu não me consigo ir embora sem o fazer levantar e sinto que poderia cair-lhe um bocado mal, era como se eu lhe dissesse, 'desculpe, não quero estar mais à sua beira, vou ali para trás, adeus, boa tarde'. Neste preciso momento estou encurralado por um gordo numa camioneta para o Porto, mas, ao menos, tenho um lugar à janela para ir escrevendo a minha raiva enquanto o meu ódio por ele vai crescendo e vou vendo a paisagem desenrolar-se lá fora. Quando saímos de Faro ele entrou

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (14 de Janeiro de 2016)

Estava na Fnac a ver os discos e um grupo de raparigas adolescentes estava a tentar decidir que disco comprar. Não reparei quais eram os discos que se propunham a comprar, mas vi bastantes discos dos Muse  no sítio onde elas estavam. Queriam levar dois discos. Uma delas fazia as contas ao dinheiro que tinha e a quanto custavam os discos, quando uma outra soltou esta frase monumental: - Faz as contas no telemóvel, porque é que estás a usar a cabeça? PORQUE É QUE ESTÁS A USAR A CABEÇA? Quando estas palavras chegaram aos meus ouvidos não pude evitar largar uma imensa gargalhada tonitruante. Nem sequer consegui manter-me de pé, dobrei os joelhos, inclinando-me e agarrei-me à prateleira onde estavam os discos a 40 centímetros do chão para não cair. Repeti a frase da jovem mulher: - Porque é que estás a usar a cabeça? Meu Deus, por que raio é que hás-de usar a cabeça? Vivemos no tempo em que tudo está feito para nós...Toda a papinha está mastigada. Segui naquela risota até às raparigas s

Não Gosto (50)

Não gosto de saber e ver que umas celebridades são casadas com outras celebridades. Quando oiço falar de mais um casamento entre dois famosos fico furioso. O facto de, na maior parte das vezes, os VIP’s se casarem uns com os outros faz-me olhar para o amor e para o casamento como uma coisa artificial e sem valor. É uma grande e estranha coincidência as pessoas famosas encontrarem o amor da sua vida entre outras famosas porque há tantas pessoas no mundo, tão diferentes entre si, por que raio hão-de ter encontrar a pessoa com quem partilharão a vida nos fechados e obtusos meios que frequentam? Para mim, como já disse noutras ocasiões, o casamento é uma instituição caduca e ultrapassada; não faz qualquer sentido nos dias de hoje, em que há uma grande mobilidade e todas as pessoas se podem encontrar, casar e dedicar a vida a apenas uma pessoa, mas estes casamentos entre VIP’s parecem-me uma coisa “só para inglês ver”, como se diz na gíria, para vender notícias com fotos pomposas, para ver

Não Gosto (49) (P)

Não gosto de pessoas que, quando se referem a balizas de futebol, dizem poste em vez de dizer barra, ou que dizem barra em vez de dizer poste. Se não sabem ao certo qual a expressão que usar digam “ferro”. “A bola foi ao ferro”. Eu, pessoalmente, consigo sempre ver se a bola vai ao poste ou à barra, mas compreendo que algumas pessoas não consigam ver. Para elas existe essa expressão do ferro, que engloba todas as fronteiras férreas da baliza.

Gosto (62)

Gosto de me sentar em lugares nos quais a vista que albergo é perfeitamente simétrica. Por vezes fico sentado durante horas em bancos de jardim, a olhar para a perfeita simetria dos jardins habilmente construídos para o prazer dos homens por talentosos escultores de flores. Faz-me sentir uma serenidade indescritível, sinto que me fundo com a Natureza e que a Natureza se funde comigo.

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (13 de Fevereiro de 2016)

Enquanto folheava um livro policial em checo e lia frases aleatoriamente, deparei-me com uma palavra que causou em mim uma forte impressão. A palavra era "smrt". Descrever a impressão que essa palavra me causou ainda se me afigura como algo muito difícil. Para além de ter sentido um calafrio, fiquei muito curioso por saber o seu significado, mas também fiquei ensombrado, de certa forma e não sabia explicar por quê. Li 200 ou 300 palavras desse livro, mas só "smrt" ficou gravada na minha cabeça. Algo muito misterioso acerca desta palavra é o facto de ela ser composta apenas por consoantes, o que me fez estranhar muito, uma vez que não existem palavras só com consoantes na língua portuguesa. Saí da livraria para as ruas de Praga que pululavam de vida, mas não havia muitos checos naquela zona. A capital da República Checa foi tomada por turistas e, neste dia específico, parecia-me ter mais russos e coreanos que checos, por isso custou-me arranjar alguém naquela rua par

Não Gosto (48) (P)

Não gosto de não conseguir adormecer. Para mim, é um grande sentimento de impotência, ficar às voltas na cama, sem conseguir pregar olho, vendo, por vezes, a manhã solarenga esgueirar-se entre os buracos da persiana, o que me causa um imenso peso na alma. Eu, pelo menos, sinto-me um verdadeiro idiota e censuro-me pelo tempo que perco a debater-me com os lençóis húmidos do suor de uma noite de verão e, por vezes, sinto-me tão quente que acho que vou arder de loucura enquanto dou voltas e voltas em busca da posição perfeita e nunca consigo acabar com essa pequena farsa que é estar para ali, às voltas na cama a ver se durmo. Era simples: levantava-me da cama e ia fazer outra coisa, mas sou incapaz, fico sempre à espera que o sono chegue e, por vezes, demora horas. Uma coisa que me costuma ajudar a adormecer é a masturbação. Costumo masturbar-me duas, três vezes por noite, mais caso esteja com muita dificuldade em adormecer. Depois disso fico mais relaxado e é mais fácil passar a ser embal

Voda parece vida, mas é água

O tempo não cede à passagem dos segundos imperdoáveis Mas o vento cede as estruturas de alta voltagem Irremediáveis estalidos eléctricos explodem de novo No coração, na alma, nas veias inconquistáveis É hora de correr para a morte repetida Está na hora, está na hora Os cães ladram ao longe e o galo assustado não vai cantar esta madrugada Iluminada por um amanhecer sangrento nas colinas E ao longe vogou a densa sombra da morte Os seus fantasmas, mais perto, nas cortinas Encantavam-me para a vida e para a sorte Nadir Veld

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (23 de Maio de 1976)

A sorte é uma vagabunda deambulando na vida à espera de ser nomeada. É uma incógnita, é o que acontece. A sorte é o devir e o julgamento do merecimento vem no futuro com esse devir. Podemos ter tido sorte ou não no entretanto. Há pessoas cuja sorte praticamente não existe, não tem hipóteses de se efectivar por um elevado número de razões, nomeadamente geográficas. Há sítios em que há pouca sorte a pairar na atmosfera e o azar em todas as ruínas cai sob a forma de pó e estuque. Aprisionados nesse azar os seres humanos tentam sair a não ser que tenham metralhas e estejam aos comandos dos Senhores da Guerra, então, nesse caso, têm muita acção pela frente, há que pilhar essas cidades todas, despojar o bem da terra, servir os Senhores do Inferno, os Senhores do Mundo, propagando azar durante imortais gerações. A História foi demasiadas vezes contada, todos sabemos o que aconteceu com a sorte e com o azar no outro dia. Desde Jesus, e até antes dele, homens armados conspiram na sombra congemi

Gosto (61) (P)

Gosto de ter as unhas das minhas mãos cortadas assimetricamente. Quando corto as unhas nunca o faço de maneira a que fiquem todas cortadas, deixo, normalmente, duas em cada mão por cortar. As unhas são um instrumento utilitário que pode dar bastante jeito, sinceramente não entendo por que raio é que as pessoas cortam as unhas todas, privando-se a si próprias de um excelente utensílio. Por exemplo, se uma pessoa tem uma comichão, pode coçar-se com o dedo sem unha, mas esse coçar não garante o mesmo prazer que o arranhar com a unha garante. Falo de comichão, mas poderia falar de milhares de outras utilizações da unha das quais se privam as pessoas que, estupidamente, cortam todas as unhas da mão. Há alguma razão para as pessoas terem as unhas todas cortadinhas? Já fui gozado por muitos dos meus amigos por ter as unhas assimétricas, umas cortadas outras não, coisas como "és mesmo cabeça no ar, Zenit", "olha para as unhas deste gajo", gargalhadas sem fim e tudo mais. Eu

O Início do delírio (parte 2)

marosca com marisco e mariposa espero que a deixe bem disposta e que abra a sua buceta gostosa que a encontre gulosa e que lhe dê boa resposta

O início do delírio (Parte Um e Introdução)

O Início do Delírio (Introdução) Neste livro colocarei textos que julgo serem meus e que encontro escritos à mão com uma letra lunática ou no computador. Muito provavelmente tratam-se de textos escritos a altas horas da noite. Decidi compilá-los porque há algo neles que parece prenunciar que estou a entrar na última fase do delírio, num estado de loucura permanente que começo a achar ser a normalidade. Escrevo-os também para que sabeis que estou consciente do meu desvio, mas que não faço nada para mudar a direcção de um barco há muito destinado e explodir espectacularmente no mar perdido O Início do Delírio (Parte Um) Mais de uma volta ao mundo na solidão da lua minguante sentado, pescando as estrelas que no céu mais brilham e apanhando as que menos brilham com a minha rede de caçar borboletas, coleccionado luzes que coloco no bolso e no atrelado, quando o bolso fica atafulhado. Com as estrelas tilintando nos meus bolsos puxo o atrelado e dirijo-me a onde a noite acaba para cri

Profecias Atmosféricas P

Um acontecimento sucederá E outro acontecerá na sua sequência

Revolta (Carta enviada ao Ministro da Ciência) (PASSSSS)

Drogados de merda! Aprendam a fazer a noite mais longa quando ela tem de ser mais longa e o dia mais longo quando ele tem de ser mais longo, num lusco fusco infinito de perfeitas cores conjugadas nos céus esplendorosos! Um pôr do sol eterno para os copos de vinho no rio e uma madrugada sem fim para aqueles que nunca se deitam porque estão preocupados com mil e uma coisas menos no dia seguinte. Filhos da Puta! Cientistas de merda! O que é que vocês estão a fazer com os Dinheiros Públicos!?!? Convertam as noites eternas imediatamente! Parem o maldito movimento de translacção! Façam a Terra girar ao ritmo das minhas emoções, seus malditos, charlatões...! Criaram a MÁQUINA DOS TEMPORAIS INFINITOS e não podem criar o simples controlo remoto do movimento auto-giratório do Planeta Terra?!? Como é possível sermos tão pouco civilizados naquilo que demandamos aos nossos cientistas...simples viagens espaciais em máquinas sem humanos! Em máquinas sem humanos...Um desperdício de lixo espacial que h

гипнотизирующий ночь (gipnotiziruyushchiy noch') - Noites Encantadas

Last night I was going on the street, lullaby on the sidewalk running away from that italian accent that was attacking me for years and I met two girls, passers by as well and I asked them what they were studying and they sayed to me that they were students of mental injuried people treatment, at least that was what I get from the laughs and the different language (croatian I believe). They were twirling around with their skirts the red hair and the blue eyes and I couldn't contain myself. - I suffer from mental disturbance, dreaming crazy lunacies and nowadays I can't tell the dreams from the real lives. I told them this in a very calm way, much like a priest would behave but my eyes were on a fire circle and the tear was drop on a torch that burned my face and I had a судорога, I don't remember the english word for that, I have to find out...is spasm, I had a spasm. And when I come out from eat I didn't recognize myself in the strangers eyes. The problem is that the

Gosto (60) P

Adoro aquela menina eslovaca que passou por mim hoje em Bratislava, quando visitava um amigo meu português. Ela tinha uns pequenos calções justos às suas incríveis ancas, o que dava um grande realce às suas maravilhosas formas. A coisa mais estonteante na sua figura era a forma como ela colocava o seu computador portátil, encostado à sua anca, impossibilitando que se vissem os seus calçõezinhos azuis, dando a ilusão de que aquela angélica loira caminhava nua, caso olhássemos para ela de perfil. Continuarei apaixonado por ela até ao dia em que morrer. Ela é daquelas raparigas que está ciente que a sua mera presença pode alegrar o dia de um homem.

Argumento do filme "A abelha e a cerveja"

Estava em Belgrado com o meu amigo Branislav Sremac, a beber cervejas e a apreciar a calma da vida no balcão de sua casa, quando uma vespa enorme fez com que ele fugisse para dentro de casa. O vespão, atraído pelo delicioso sabor da cerveja e vendo o copo do Branislav desprotegido, aproveitou para se apoderar dele e para beber com deleite a cerveja do meu amigo sérvio. Infelizmente não filmei o momento em que o vespão se precipitou para o copo, seria uma bela imagem e eu detesto perder excelentes imagens, contudo ficará para sempre gravada na minha memória. Fiquei bastante chateado com o Branislav e disse-lho, realçando que "nunca, mas nunca devemos deixar as nossas bebidas alcoólicas desprotegidas e que, caso seja necessário devemos protegê-las com a vida." Eu acabei por perdoá-lo quando ele me pediu desculpa. Voltámos a encher os copos e ficou tudo bem. Agora posso fazer montagens bizarras com as duas vespas que filmei, uma bebendo água do olho de um peixe morto e outra b

Contos Eróticos de Fernando Bacalhau (Alexandra Lencastre)

Estava a viajar à boleia no Alentejo, farto de que os velhos passassem sem parar para me acolher, quando avistei ao longe um carro vermelho que me encheu de esperança, porque havia algo naquela cor que destoava da apatia a que os carros que iam passando me habituaram. Estendi o dedo polegar, perdendo um pouco de esperança quando reparei que o carro era guiado por uma mulher loira, porque as mulheres, quando viajam sozinhas, não costumam parar para dar boleia. Preparado para mais uma decepção, esbocei o meu sorriso mais charmoso e esperei pela sorte. E não é que ela parou mesmo?! Corri para o carro, e, quando abri a sua porta, tive a minha segunda surpresa. O carro vermelho era conduzido pela voluptuosa Alexandra Lencastre, popular actriz portuguesa. - Entra, entra, eu não costumo dar boleia a qualquer pessoa. - disse-me ela e depois trincou o lábio. Esta frase fez com que o meu coração disparasse, o meu sangue acelerou em torrentes e eu senti o meu membro preferido a agigantar-se den

Argumento do filme "Paivas Cruzando o Danúbio" (Gosto 1 em filme)

Gosto de me sentar pacificamente nas margens do Danúbio, pensando na vida e, quem sabe, fumando um paiva que me deixe em maior comunhão com esta natureza que tento escutar. Depois de o fumar, lanço-o no Danúbio e vejo-o afastar-se na corrente. Vemo-nos em Budapeste! Costumo gritar-lhes quando os lanço a montante da capital húngara e depois imagino todo o seu percurso nesta água maravilhosa, neste rio que mais parece um mar do centro da Europa. Vejo-o passar em Esztergom e a parar, petrificado de maravilhamento, na mais bela catedral do Danúbio. Como não tenho dinheiro para os barcos, nadar mentalmente costuma ser o meu meio de transporte preferido neste grande rio Danúbio. A água continua a ser o meu elemento preferido, aquele que me deixa sempre feliz quando me envolve. A água e a sua mágica canção, serenam a minha alma eterna, por isso rezo devotamente a esta divindade líquida, à mãe de toda a vida, de onde todas as espécies vieram e para onde todas as espécies deviam ir quando mor

Argumento do filme "Domadora de Cavalos" de Nadir Veld, 2016 - diálogos

Sempre sonhei fazer sereno e sincero amor com uma domadora de cavalos, ah lambedora de doces falos...Eu sou assim, fotografo e gravo aquilo que invejo e guardo-o para mim, para me recordar de forma dolorosa das coisas que perdi. Eu sou auto-martírio, enveneno a minha própria esperança.

Não Gosto (47) (P)

Não gosto de falhar uma fotografia perfeita por segundos . Noventa por cento das vezes que vejo um acontecimento surpreendente que merece ser fotografado ou filmado não tenho o material pronto para a tomada da imagem, pelo que me precipito para ele muito rapidamente, mas, mesmo assim, acabo quase sempre por perder a oportunidade, porque aquilo de único e irrepetível que eu vi acontecer já não está a acontecer. Restam apenas os vestígios do acontecimento e, mesmo assim, eu fotografo-o, o que resulta numa triste fotografia falhada, que ainda por cima se aproxima de uma imagem de perfeição que tivemos (costumamos pensar: Se ele estivesse ali e o braço dele não se tivesse movido naquela direcção!)

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (3 de Maio de 2016)

Oh, meu Deus, há tantas coisas para fazer! Tenho de estudar meia hora de sérvio, catalogar 212 fotos tiradas a uma árvore, meter conversa com pessoas excepcionais cujos dons mais virtuosos servirão de candeia para alumiar o meu caminho completamente aleatório, tenho de montar 8 dos filmes que filmei a semana passada, tenho de acabar 12 dos meus contos, terminar o meu romance documental sobre as aparições de Nossa Senhora, agora de Fátima, senhora de fátima em portugal, tenho de arrumar tudo isto e dar uma ordem à minha cabeça.

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (25 de Abril de 2016)

Pela primeira vez em muitos anos passei o 25 de Abril longe de Portugal, onde o dia da Revolução dos Cravos é celebrado com grande pompa. Neste dia costumo ouvir as músicas anti-regime de Zeca Afonso, as músicas contra o estado das coisas do José Mário Branco e músicas melancólicas que lembrem esses terríveis tempos. Estava com o meu amigo Milorad a ouvir e a cantar de forma bastante emocionada a música Cantar de Emigração do Adriano Correia de Oliveira, cuja letra foi escrita em galego pela grande Rosalía de Castro e traduzida brilhantemente por José Niza quando ele me pediu para lha traduzir para inglês. Quando cheguei à parte Galicia, you stay without men, expliquei ao meu amigo Milorad que a Galiza era uma parte de Portugal, país pelo qual ele sabe que eu tenho um grande amor. Acrescentei ainda que a Galiza não faz parte de lugar nenhum e é uma comunidade bastante própria em Portugal. Disse que até tinham uma língua diferente, na qual o poema original tinha sido escrito. Com esta m

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (27 de Abril de 2016)

Hoje acordei sobressaltado às quatro e meia da manhã no meu quarto alugado numa zona quase central da cidade de Novi Sad na Sérvia. Senti um frio percorrer-me, como se um espírito gelado tivesse passado pelo chão do meu quarto em ascensão até ao tecto. Percebi que se tratava da própria Morte quando o calafrio mais frio que alguma vez percepcionei escalou pelo meu corpo um arrepio que eriçou todos os meus pêlos. Corajoso, abri os olhos e enfrentei-A. Finalmente o meu momento tinha chegado. Vivi uma vida maravilhosa, cheia de aventuras e conquistas. Tudo chega ao fim um dia. Esperei, mas, para meu grande espanto, nada aconteceu, os meus pêlos deixaram de estar erectos, o frio que me percorrera aqueceu. Continuei vivo. Comecei a pensar no que teria sido aquilo e fui completamente incapaz de dissociar aquele sentimento do sentimento negro da Morte. Não consegui mais adormecer, temendo que a Morte pudesse reaparecer a qualquer momento, Ela parecia ainda estar ali. Às sete e meia da madrugad

Segurança 322

De quarto para quarto há cores feitas de céu, Mas das esquinas surgem vultos que a vida perdeu, Sombras da morte que dançavam por trás do véu quando a comunhão em verde esperança sucedeu. Essas almas doentes e negras que a vida não viveu Trabalham incansavelmente para fazer do inocente réu

Não Gosto (46)

Não gosto quando alguém que eu conheço se esgueira por trás de mim e tapa os meus olhos com o intuito de que eu adivinhe de que pessoa se trata apenas pela voz. É um comportamento patético que eleva a pessoa que o pratica aos altares do mais inalcançável ridículo. Para além de ser muito incómodo uma pessoa ver-se privada daquele considero o mais importante dos sentidos, é bastante desagradável levar com as mãos de uma pessoa nos olhos, que, em princípio continuarão abertos. Já me aconteceu uma amiga minha, com as mãos geladas, esgueirar-se por trás de mim e perguntar-me com uma voz doce se eu sabia de quem se tratava. Eu disse que não só não sabia, como não queria saber, libertei-me das suas mãos e fiz-lhe entender que o nosso relacionamento chegara ao fim. O contacto de mãos geladas com a nossa pele é terrivelmente desconfortável e, a mim, pode levar-me à loucura. Ainda outro dia, passeava em Belgrado com o meu amigo Dušan, que usa óculos, quando uma sua amiga apareceu nas suas costas

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (18 de Abril de 2016)

Quando ignorei aquela moeda de um cêntimo que estava no chão sujo e molhado não podia imaginar que estava a cometer um erro crasso. Ignorei-a não apenas porque não me estava a apetecer inclinar-me para a apanhar, mas também porque havia pessoas a passar e eu, naquele momento específico, não queria passar pela vergonha de ser daquelas pessoas que se baixa para apanhar as moedas pretas deixadas no chão pelos outros. Mais tarde, entrei numa loja para comprar fita cola. Custava 45 cêntimos. Juntando todas as minhas moedinhas reuni 44 cêntimos. Amaldiçoei-me por não ter apanhado a moeda e paguei com uma nota de 20 euros. A senhora, simpática, não tinha notas, por isso encheu a minha carteira de moedas sobretudo de um euro, só me deu uma de dois, três dos euros foram obtidos da junção de seis moedas de cinquenta e creio que me deu três euros em moedas de 20. E é assim. A prova de que uma insignificância nos pode ficar a pesar na carteira, que agora carrego, muito pesada, no bolso de trás. At

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (19 de Abril de 2016)

Ouve-o, ele é o Grande Maestro Colocou as aves nas copas das árvores e fê-las voar com as primeiras canções que orquestrou as primeiras trovejadas Não sei o que fiz à pressa e devia ter feito lentamente nem o que fiz lentamente e devia ter feito à pressa. Se calhar ainda faço à pressa o que devia fazer lentamente e vou fazendo lentamente aquilo que devia fazer à pressa ou que devia até nem fazer, nem nunca ter feito, em altura da minha vida porque lhe chamamos (erronemente) tempo perdido, poupando (no futuro) e ganhando (no passado perdido) tempo para fazer o que tenho de fazer e o que deveria ter feito. Eu acho que o tempo não se perde nem se ganha, ele simplesmente continua numa corrente traiçoeira em que nos vemos à volta, sempre esperançosos. Onde quer que tu estejas estás sempre a perder alguma coisa noutro lado. Agora a casa está abandonada. Só eu estou nela agora, só eu estou nela agora, o que posso fazer quando todos os outros hóspedes me deixaram a possibilidade de n