Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (6 de Abril de 2016)

Esta noite assaltou-me um assustador sonho. Mais uma vez, no limiar da realidade, surgiu-me uma imagem assustadora, uma possível imagem das trevas. Estava numa casa em Esztergom na Hungria, numa casa que não parecia partilhar com ninguém. Não sei se a aluguei, nem o que lá estava a fazer, também não sei se isso interessa muito. Estava à janela a ver a imponente Basília de Esztergom, Nagyboldogasszony és Szent Adalbert prímási főszékesegyház, que se ergue como um inacreditável Monte Olimpo alicerçada em sumptuosas colinas dóricas, a Igreja mãe das Igrejas da Hungria, como o faz perceber a inscrição em latim dourada e gigante num dos seus lados: Caput Mater et Magistra Ecclesiarum Hungariae, algo que pode ser traduzido para A Cabeça, Mãe e Mestra das Igrejas da Hungria. Não sei se existe mesmo uma casa com tão boas vistas para a Catedral, mas aquele em que eu estava, no meio do meu sonho, era um soberbo sítio para a contemplar. Era de noite e ouviam-se corvos corvejar gritos assustadores na margem do Danúbio. Não estava, certamente, cansado de contemplar a sua esplendorosa beleza, mas, por alguma razão decidi fechar a janela e entrar e foi nesse preciso momento que uma pomba perdida e suja, com as penas húmidas e desordenadas se precipitou para dentro da divisão em que eu estava. Não sei porque é que o meu gesto foi tão demorado, como se eu tivesse um atraso mental, mas só fechei totalmente a janela, rodando o manípulo, depois de ter visto que a pomba estava dentro da divisão. Clarividente novamente, abri a janela e comecei a enxotar o maldito animal que largava penas por todo o lado. Eu tenho um ódio particular por pombas principalmente por causa destas sujas e intrometidas que se metem na vida de toda a gente. Consegui fazer com que a desgraçada poisasse no parapeito e empurrei-a violentamente, mas, no preciso momento em que a empurrei ela transformou-se numa mulher vestida com um quispo beje. Não me consigo recordar do exacto momento em que se deu a transformação da odiosa pomba numa misteriosa mulher, não estou sequer certo de estar a olhar para ela nesse preciso momento. Ouvi um pesado baque no chão e, por alguma razão, talvez por me ter parecido ouvir um som que se assemelhava a líquido espesso caindo na calçada, imaginei um jorro de sangue a elevar-se do chão e a espalhar-se por volta do corpo da malograda mulher. Contemplei a linda Basílica Primacial da Abençoada Virgem Maria Subida aos Céus e Santo Adalberto com um martelar frenético no coração, aproximei-me da janela com a intenção de ver se, de facto, estava uma senhora morta lá em baixo, mas tudo o que consegui fazer foi fechar a janela e, acto imediato, acordei com a mão no nariz, sentindo algum calor húmido. Aproximei-me do espelho do meu quarto e vi que sangrava do nariz e tinha as mãos cheias de sangue.
Estive em Esztergom há bastante pouco tempo, foi certamente por isso que sonhei com ela, mas o resto do sonho parece-me completamente indecifrável. Por que se transformou a pomba numa dona que eu fiz voar pela janela em sentido contrário à abençoada Virgem Maria, que subiu aos céus com grande esplendor? Por que não lhe deram asas de pomba os artesãos da minha imaginação?



As vistas para a Basílica eram semelhantes a estas, mas sem o Danúbio, o que quer dizer que eu estava em Esztergom e não em Štúrovo

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