Assim se Cumpre em Mim a Lei de Talião (26ª Parte)
Acordei com a ansiedade do Homem Orquestra a fazer-se ouvir através de sons
desconcertantes descompassados. Quando a Terra tremeu outra vez fez o som de
vidros a partirem-se. Do outro lado do riacho elevava-se um grande cume.
Baixei-me para beber água e, nos meus olhos, brilhou um reflexo proveniente de
um espesso tufo de ervas. Fui até lá e encontrei uma reluzente armadura de um
vermelho brilhante, um escudo prateado, um elmo de bronze e uma espada com cabo
dourado. Armei-me, o Homem Orquestra começou a tocar orquestrações que apelavam
à batalha e subi o cume sob o sol nascente. Quando alcancei o cume e enxerguei
o horizonte vi um imenso abismo que se estendia por milhares de quilómetros
interrompendo uma paisagem árida. A minha passagem estava vedada, mas ainda
assim aproximei-me do buraco para perceber porque existia e se era lá que a
Terra tremia. Seguia no terreno seco de terra a apenas dois quilómetros do
abismo quando o Homem Orquestra soou como trovões e parou de andar. Deixei-o
ali e avancei rumo ao buraco. Do outro lado nada parecia haver a não ser
nuvens, tudo era buraco e vazio. Quando lá cheguei olhei para as profundezas.
Nada havia a não ser vazio enfiado num buraco imenso. Gritei para a escuridão.
-Que magia escondes tu, demónio maldito?
-Que magia escondes tu, demónio maldito?
Uma voz rouca e lugúbre, clara como se falasse do nosso próprio princípio
de existência como se contivesse em si a compreensão de todas as almas, surgiu
lá bem do fundo.
-Maagia?
Fiquei aterrado ao ouvir esta voz. Exasperadamente tentei que me explicasse
tudo.
-Deus ou Diabo que horrível criatura és tu?
Uma gargalhada foi a resposta.
-Contenho em mim aquilo a que os homens chamam Deus e aquilo a que chamam
Diabo e muitos outros conceitos que ainda não foram inventado.
-És o Criador ?
-Não sei se sou o criador. Sei que quem tem o poder aqui sou eu. E vou
continuar o que estava a fazer.
Das profundezas vi
surgir um gigantesco canhão propulsionando meteoros. O primeiro foi disparado
para o céu e, com uma explosão, fez chover as vacas que eu achava ter salvo.
Tive de ter cuidado para os cadáveres sangrentos não me cairem em cima. Usei o
escudo para me proteger. Quando o canhão redireccionou a pontaria do disparo
para a terra onde me encontrava percebi, antes que acontecesse, a razão do
tremor de terra. Comecei a correr de volta para o Homem Orquestra enquanto o
fumo se elevava do buraco. Ele continuava perdido soando agora como a
tempestade. O canhão disparou o meteoro contra a Terra e eu e o Homem Orquestra
caimos enquanto a terra cedia sob os nossos pés. Agarrei nele, corremos,
chegámos ao topo do cume e aí, descemos rapidamente, correndo. Quando chegamos
de novo ao riacho, olhei para a montanha e vi um meteoro explodindo-a. Choveu
terra em cima de mim e o monte ficou a arder. Lá em cima, vi pequenas sombras
andando no fogo. Começaram a descer em minha direcção. O Homem Orquestra
percebeu o que estava a acontecer e escondeu-se. Três silhuetas de corpos de
homem em chamas desciam a montanha. Quando chegaram cá a baixo eu estava
deitado no riacho. Encharcado levantei-me e encarei-os com a minha espada. O
Homem Orquestra soou como uma avalancha e dois deles fugiram. Os outros
atacaram-me ao mesmo tempo. Usei o meu elmo para deitar água num deles e o
outro ataquei-o, trespassando-o com a espada. Caiu e desapareceu. Aquele em que
eu deitei água estava no chão febril e eu concedi-lhe o Golpe da Misericórida.
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